O movimento da reforma sanitária
brasileira, que tomou corpo, principalmente, na década de 1970, mais que
promover a crítica do modelo de atenção que vinha sendo adotado no Brasil e
propor alternativas sob a influência da teoria dos determinantes sociais, tratou-se
também de um movimento de articulação política, que se associou aos demais
grupos que questionavam o regime militar. Nesse sentido, suas propostas
enfatizavam a democratização da gestão e o empoderamento da população para
participar das decisões sobre a saúde. Tratava-se de politizar, sobretudo a
partir do âmbito local.
Nesse sentido, a idéia de
participação da comunidade e, consequentemente, de controle social, está
presente nas propostas reformistas desde seu início. Referida diretriz reflete
a intersetorialidade da articulação em prol da saúde, que mobilizava diferentes
categorias e segmentos da sociedade e da economia.
Assim, a participação da comunidade é
princípio do SUS, conforme o art. 198, III da Constituição. Referido princípio
permeia a gestão da saúde e sua primeira disciplina encontra-se na lei 8142/90.
Nesta lei, estão previstos os seguintes mecanismos institucionais de
participação: os Conselhos de Saúde, de caráter permanente e deliberativo, e as
Conferências de Saúde, convocadas periodicamente para definição das prioridades
e estratégias de gestão.
Outro importante foro para
participação popular são as audiências públicas para prestação de contas do
gestor, as quais devem ocorrer quadrimestralmente nas respectivas casas
legislativas (câmaras municipais, assembléias legislativas e congresso),
conforme exigência da Lei complementar 141/12.
De seu turno, o Ministério Público,
cujo perfil institucional foi redefinido pela Constituição de 1988, tem como
deveres a defesa ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais
e individuais indisponíveis (art. 127).
Na sua missão de defender a
democracia, deve o Ministério Público, ao velar pela observância dos direitos
consagrados na Constituição, e, dentre estes, a saúde, aproximar-se da
população, fomentar sua participação na gestão pública e exercer verdadeira
função pedagógica para o exercício da cidadania.
Com efeito, apenas o verdadeiro
soberano de todo o poder estatal - o povo, nos termos do art. 1º, par. único,
da CR/88 - pode ditar os rumos do Estado, devendo fazer isso não apenas por
meio de seus representantes, mas também diretamente, valendo-se dos mecanismos
institucionais e das formas legítimas de manifestar seus interesses.
No que se refere à saúde, a par de
todo o pano de fundo constitucional, vê-se que, desde as origens, essa política
pública é marcada pela democracia, razão pela qual ultrapassa a simples
disponibilidade de serviços a um usuário passivo. Na verdade, o usuário deve
agir ativamente, já que a política pública deve refletir os seus anseios e
necessidades e não o resultado de técnicas gestadas por burocratas. Com isso, a
política de saúde cumpre papel decisivo para exercício da cidadania.
Nesse contexto, o Ministério Público
apenas se desincumbirá de seu munus de defesa do direito à saúde se
contribuir para o fortalecimento da participação da comunidade no SUS, seja
verificando a regularidade formal e de funcionamento dos conselhos de saúde, a
periódica realização de conferências de saúde e das audiências públicas, bem
como aproximando-se dos movimentos sociais e contribuindo para o esclarecido
exercício do direito.
Agindo dessa forma, velando pelo controle social, o Ministério Público,
a um só tempo, contribuirá para a efetividade do direito à saúde, conforme a
Constituição, e para o fortalecimento de nossa democracia.
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